quinta-feira, 2 de agosto de 2018

O problema é a (falta de) educação

Um dos maiores chavões brasileiros é dizer que o problema do país é educação. Eu, professora universitária, não poderia negar esta verdade, mas preciso explicitar a mentira que ao mesmo tempo ela apresenta.
Valorização da educação no Brasil é um discurso, não uma prática. Ele retorna com força quando há crimes bárbaros, vandalismo, crianças nas esquinas, economia em declínio... Educação é remédio mágico para quase todos os problemas, mas poucos realmente se comprometem com ensino e aprendizagem.
No mundo das palavras, o professor é tratado como semi-deus, o ser abnegado que, contra todas as adversidades, leva as crianças ao conhecimento. Isto até que o docente avalie que um estudante não atingiu os objetivos de aprendizagem. Não são poucos os relatos de professores agredidos ou pressionados por pais para que o resultado final seja revisto ou que o aluno possa "fazer um trabalhinho para recuperar a nota". Bem assim, recuperar nota. Ninguém falou em aprender.
Este "magistério-sacerdócio" tem mais uma consequência nefasta. O professor não pode parar de ensinar, mesmo quando está ganhando mal ou recebendo com atraso. Se o faz, é duramente criticado. Ele só é valorizado no discurso. As pessoas tem a ilusão de que professor tem longas férias, e desconhecem que temos só um mês, como todo mundo. Dar aulas exige preparação anterior, antes e durante os semestres letivos, e muita, muita correção de trabalhos e provas em casa.
A educação é importante para a sociedade, mas desde que o professor ensine só o que eu quero que ele mostre. Eu valorizo a Educação, mas não vacino meus filhos porque é perigoso, não considero certo falar em igualdade e respeito em sala de aula e acho que os livros de História estão errados.
Falando em livro... quem tem o hábito da leitura? Ontem eu estava pensando:  há estímulo para consumo de tudo que é coisa, mas não tem comerciais com propagandas de livros e de livrarias (na sua região tem?). Mas educação é a salvação do país. O professor é o herói que vai fazer isso tudo sozinho, resolvendo (também) os problemas que deveriam estar com psicólogos, pedagogos, conselho tutelar... e com os pais. Acreditamos que o professor pode fazer tudo isso, mas não o escutamos quando ele critica propostas de mudança na política educacional. Nessa hora, o chamamos de corporativista e o acusamos de não querer perder privilégios (não sei quais).
Algumas das questões que citei até aqui dizem mais respeito ao ensino fundamental e médio, mas o ensino superior não está livre das incongruências. Queremos educar para fazer o país crescer. O que fazemos? Cortamos a pesquisa. Nesta quinta-feira, o dirigente da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior), anunciou que o orçamento previsto para a área só será suficiente para pagar as bolsas de pesquisa até metade de 2019. Depois disso, quem quiser continuar pesquisando terá que se manter de outra forma. E tem gente que aplaude isso, sem entender as consequências para o desenvolvimento científico.
A debandada já começou e vai se intensificar. Os melhores cientistas estão indo embora, pois encontram em outros países condições de pesquisar que não recebem aqui . Ficará o discurso "educação para mudar o país", a ser repetido para uma nova geração de estudantes, sobre a qual jogaremos a expectativa de um futuro mais desenvolvido, sem termos dado a eles a estrutura necessária para essa arrancada, que é gerar conhecimento e tecnologias próprios.

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